sábado, 19 de março de 2011

A arte de Escutar


de Dora Porto, Master em Matrimônio e Família pelo ICF - Universidade de Navarra. Diretora do programa Protege tu Corazón Brasil (www.protegetucorazon.com.br.

Talvez vocês não se lembrem do tempo em que as cidades eram menores e as pessoas sempre tinham alguém par conversar. Era só chegar no beiral da janela, ou no portão, que logo havia uma vizinha, um conhecido, para bater um papo, para "jogar conversa fora".

É certo que também surgiam muitas fofocas e maledicências! Mas as pessoas tinham com quem falar. As famílias moravam mais perto umas das outras, havia um maior relacionamento com famílias extensas, e sempre havia uma "tia" que era aquele "bom ouvido", com quem podíamos nos queixar, desabafar e pensar na vida!

Hoje, devido à necessidade de segurança, levantamos altos muros, isolamo-nos dentro de nossas casas, comunicamo-nos muito mais virtualmente do que pessoalmente. Sem falar das distâncias e do trânsito, que impedem uma maior proximidade com nossos familiares e amigos.

Pois é! Mas não podemos cair nessa ladaínha de reclamações, nem de um saudosismo barato. Isto é uma constatação.

Muitas pessoas adoecem psicologicamente, por não terem com quem falar de seus problemas, seus sonhos, seus medos etc. Sem contar os idosos que, pela dificuldade de locomoção e a falta de independência, acabam abandonados em suas casas ou até nos asilos e hospitais.

O que fazer? Como solucionar este problema?

Precisamos reaprender a escutar, e isto pode começar dentro da nossas própria casa. Escutar os filhos, os pais, os amigos, pode ser uma prática bem interessante.

Aprender a escutar? Não basta ter ouvidos? Aí é que nos enganamos. Uma coisas é a nossa capacidade de ouvir, e outra, muito diferente, á a atitude de escuta.

Quem escuta deve estar disposto a compartilhar a intimidade do outro. A intimidade humana, diz Polaino Lorente, no seu livro A arte de escutar, não se satisfaz a si própria no seu hermetismo. A intimidade da pessoa tem necessidade de ser compartilhada.

E o que abriga nossa intimidade? "Abrigar as nossas decisões, interesses e motivações; o que a pessoa percebe, sente, pensa, recorda, projeta e faz; as consequencias de tudo isto; as intenções que a animaram e as frustrações que sobrevieram; os resíduos que vão tecendo a sua evolução biográfica com seus acertos e desacertos, êxitos, fracassos, alegrias e tristezas".

Isto quer dizerque temos um mundo interior rico e complexo, normalmente blindado para estranhos. Mas é nesse mundo onde nascem nossos ideiais, de onde brotam nossas ideias e, se não o abrirmos para alguém, muitas vezes esses projetos acabam por não se realizar.

O fenômeno das redes sociais é uma realidade onde as pessoas compartilham, têm necessidade de saírem de si mesmas, de contar o que fazem, de dividir alegrias, de trocar informações, contatos e tudo o mais.

Esta nova forma de comunicação virtual é boa, é necessária, mas não substitui a presença física de uma pessoa com um ouvido atento, com uma vontade decidida de penetrar dentro do que é possível, na intimidade do outro para oferecer um estímulo, uma palavra de ânimo, uma ideia, um conselho, um consolo e, muitas vezes, um silêncio eloquente e respeitoso, cheio de carinho.

Nós brasileiros, ao contrário de muitos outros povos mais fechados, temos essa qualidade de "pôr para fora" aquilo que pensamos, sentimos, fizemos. Aliás, às vezes até demais e com a pessoa errada. Pois constatamos diariamente que quem não tem com quem falar, fala com qualquer um, e isto não satisfaz sua necessidade interior.

Afirma o autor citado que a própria intimidade só consegue a sua posse definitiva e a sua plenitude quando compartilhada com o outro. É tão imperiosa a necessidade humana de falar que, na ausência do outro a quem dirigir a palavra, a pessoa não resiste ao seu murmúrio interior e fala consigo própria. É falar ou arrebentar!

Por isso essa necessidade crucial do diálogo. Precisamos que nos escutem porque se alguém nos entende, acabamos por nos entender a nós mesmos. É natural que sem a fala não pode existir o diálogo. Mas sem alguém que escute, também não.

Podemos, se quisermos, treinar esta atitude de escuta. Quando um filho, ou a(o) esposa(o) se aproximar, contenha-se! Acolha com o olhar, com a postura (desligando a TV, fechando o jornal, ou desligando o celular) e dê um tempo para que aquela intimidade, muitas vezes sofrida, solte-se e encontre em você esta deliciosa e necessária acolhida!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada por compartilhar conosco sua opinião!