domingo, 16 de janeiro de 2011

Ego executivo


Ego Executivo
Fonte: RH Portal Jan/11
O Ego pode ser definido como a soma dos pensamentos, idéias, sentimentos, lembranças e percepções sensoriais. Faz parte de todos nós e, na medida certa, é arma poderosa nas relações humanas. Porém, há limites a serem respeitados, sob o risco de o ego virar uma armadilha contra nós mesmos. No meio executivo, onde há uma concentração de poder, e as tomadas de decisões podem interferir na vida de muitos, essa exacerbação é particularmente danosa. Os profissionais precisam ficar alertas para não incorrer no erro de pensarem ser maiores do que as próprias companhias que representam.

Um exemplo emblemático é o de Kenneth Lay. O gigantesco ego do superexecutivo norte-americano, como reportou a revista "Veja" e outras publicações ao redor do mundo, ajudou a desintegrar a mais poderosa distribuidora de energia elétrica do planeta, a Enron. A empresa, após 16 anos de operação, quebrou. Lay, que morreu em 2006, respondendo a processos de fraude, geriu sozinho o conglomerado, sem partilhar com a alta cúpula os resultados financeiros que culminaram em sua concordata.

O caso de Lay ganhou os holofotes porque provocou a derrocada um gigante mundial, mas os problemas que levaram a isso são mais comuns do que se imagina nas organizações, sejam elas de qual porte for. "O modelo social que o capitalismo constrói favorece o autocentramento, porque preconiza um acúmulo individual de capital (material e cultural) em detrimento de relações de solidariedade, incentivando comportamentos mais narcisistas", explica Marcelo Ribeiro, professor doutor do Departamento de Psicologia da USP.

E quanto mais em evidência a organização, maior a armadilha do ego. O diretor-geral da Rede Globo, Jorge Fernando, de 53 anos, dos quais 30 de carreira, e com 30 novelas no currículo, fala com tranqüilidade sobre as muitas crises de ego no passado. Gritava desnecessariamente com a equipe, por exemplo, na hora de solicitar alguma tarefa. Mas ao longo do tempo percebeu que essa postura o deixava infeliz. "Era um "nervosinho de merda". Na verdade, eu estava inseguro", lembra. Quando assumiu o cargo mais almejado da sua área, Jorge Fernando tinha apenas 30 anos.

No mundo corporativo, a ânsia de controle, muitas vezes exigida como estratégia de gestão, prioriza estilos autocráticos, que tendem a valorizar líderes mais narcisistas: se estabelece uma relação de dependência, em que o líder passa a impressão de extrair o máximo de si, ao mesmo tempo em que exige o máximo de seus subordinados - o que garantiria produtividade e controle, pretensamente tomados como metas inquestionáveis para uma organização. "Se pensarmos que a concepção do que é um transtorno é uma construção psicossocial, e não uma essência constitutiva, ou seja, varia de acordo com o contexto e o momento histórico, podemos dizer que o narcisista está mais adaptado ao que parece ser requisitado pelo mercado de trabalho atualmente, comenta o professor Marcelo Ribeiro.

Priscila Oliveira, psicóloga pós-graduada pelo Mackenzie, que atua há 11 anos na área de Recursos Humanos, admite que o mercado acolhe bem os egocêntricos: "O egocêntrico chega a altos patamares nas empresas; são profissionais destemidos, ousados". Mas, pondera que esses profissionais tendem a perder a noção do todo, e também de se autoavaliar.
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ÍCONES
O narcisismo é um problema recorrente em cargos de liderança. Além de Kenneth Lay, da Enron, há outros ícones incontestes. Há uma piada que circula no meio empresarial, e pergunta: qual a diferença entre Deus e Larry Ellison? A resposta: Deus não pensa que é Ellison. Principal executivo e maior acionista da Oracle, empresa de softwares, Ellison é mundialmente conhecido por ter um ego maior que sua fortuna. Há relatos de que o bilionário tem acessos de fúria quando um subordinado aparece mais do que ele.

Lay, Ellison e o chefe do executivo citado expõem uma realidade que vem se evidenciando nos últimos anos: o mercado incentiva o narcisismo e o individualismo nas organizações.

Diretora-presidente da Samcil Solidária, braço de responsabilidade social da Samcil Planos de Saúde, Dirce Chagas da Costa, 77 anos, já passou por cargos executivos ao longo de sua carreira e, com toda sua experiência, avalia que o egocentrismo, no final das contas, é uma barreira para o crescimento profissional. "Alguém que pensa que sabe tudo não vai chegar a lugar nenhum, de fato". Para ela, o ego elevado até pode ser uma ferramenta para um executivo atingir altos postos, o problema está na sustentabilidade desta posição.

Além de não se sustentar por si só, o executivo de ego elevado pode estar escondendo algo que esta pessoa não tem: talento. Essa é a opinião de Roberto Tranjan, diretor da Cempre - Educação nos Negócios. "Quem tem talento, sabe fazer a conexão entre o mundo de dentro [o ego] e o mundo de fora [os demais executivos e a empresa], passando por cima do egocentrismo", explica. "E as grandes corporações demandam, cada vez mais, descentralização e maior participação."

LADO POSITIVO
Embora o ego exacerbado seja visto por muitos como algo que atrapalha o desenvolvimento profissional, gestores de RH enxergam alguns pontos positivos nessa característica. "Depende da orientação que essa pessoa vai receber e também do estilo da empresa", avalia Maíra Montezel, gerente de Comunicação e RH para América Latina da Edwards Lifesciences, empresa da área de saúde. "O que um gestor de RH deve fazer é orientar o profissional a tirar benefícios dessa qualidade, deixando claro que há limites dentro da corporação." Segundo Maíra, a melhor característica de um líder com ego exacerbado é a autoconfiança, que pode ajudar a pessoa a conquistar seus objetivos, também auxiliando a empresa a alcançar suas metas.

Com mais de 3.000 colaboradores, o hospital Sírio-Libanês é o tipo de instituição que procura evitar a exacerbação dos egos de seus profissionais. Seu superintendente de gestão de pessoas e qualidade da instituição, Fábio Patrus, destaca que o trabalho em equipe cria uma situação inevitável de competição. "Procuramos combinar valores, agregando ao modelo empresarial nossas características históricas de filantropia, diferentemente de corporações que só pensam na competição."

POR FALAR EM EGO
O ego pode ser entendido como uma autoimagem, que construímos ao longo da vida, por meio de nossas relações com o outro e com o mundo. "Essa representação do eu é marcada pela psicodinâmica das relações entre um ego real (necessidades reais - o que eu sou), um ego ideal (necessidades impostas socialmente - o que outro gostaria que eu fosse) e um ideal de ego (desejos construídos na relação com o mundo - o que eu gostaria de ser)", ensina o professor Marcelo Ribeiro. O ego seria a resultante dessas três dimensões em contato com a realidade externa e com o mundo interno de cada um. Ele permeia nosso comportamento e nossas formas de relação com o mundo, nosso grau de autoconfiança, de satisfação e de tolerância à frustração.

Em nosso desenvolvimento subjetivo e cognitivo, construirmos gradativamente nossas formas de assimilação dos objetos do mundo e nossas estratégias para lidar com esse mundo. Percebemos que nossa vida depende de nós e dos outros. O egocentrismo e o narcisismo são importantes processos de aprendizagem, que tendem a ser superados em nosso desenvolvimento psíquico. "Quando a pessoa tem dificuldade para superar o egocentrismo, terá também dificuldades de comunicação, cooperação e de lidar com os conflitos oriundos da relação com os outros, ficando mais fragilizada e suscetível às frustrações", informa o professor.

A principal característica de gestores narcisistas é a paixão por projetos grandiosos. São profissionais ousados e criativos, e, quando acertam, costumam apresentar resultados espetaculares. Quando tomam a decisão errada, porém, o impacto também é grande. Como o Narciso do mito, são apaixonados pela própria imagem, isto é, gostam de visibilidade. Mas perseguir decisões de impacto é uma escolha arriscada e pode ruir profissionalmente um executivo - como Narciso, que de tanto contemplar sua imagem, definha até morrer

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